Bússola dos Tempos・248
Bússola dos Tempos・248
Engajar-se com o mundo
Keiko Takahashi
Um mundo que se renova com vigor
Neste mês, em resposta à estação do outono que nos convida a nos aprofundarmos nas coisas, vamos refletir sobre a essência do aprofundamento do nosso modo de vida.
As pessoas que rotineiramente usam óculos tem a sensação de que a visão fica significativamente obstruída quando, em algum momento, as lentes ficam sujas. A experiência desconfortável fica na lembrança se você já passou por isso.
Quando isso acontece, ao limpar as lentes, o mundo que se via até então se renova completamente. É uma experiência familiar, mas há uma mudança marcante.
Naturalmente, isso não significa que ganhamos uma nova visão. Significa que recuperamos a visão e o campo de visão que foram perdidos de forma imperceptível devido ao embaçamento dos óculos.
E se pensarmos bem, isso também ocorre na dimensão em que nós, seres humanos, vivemos.
Quando o mundo for renovado
Quando nós, seres humanos, vivemos nossa vida cotidiana repetidamente, todos acabamos nos deparando com o que poderia ser chamado de “sedimentos” do nosso modo de vida. Quando o tempo passa com a repetição das mesmas coisas todos os dias, sem perceber, nossos sentimentos começam a ficar relaxados, uma rotina se desenvolve, e criamos “sedimentos” no fluxo do tempo.
E esses “sedimentos” que surgem encobrem os sentimentos que deveríamos valorizar e, às vezes, nossa mente fica enferrujada e totalmente desconectada do nosso verdadeiro modo de vida.
Entretanto, em tal situação, há acontecimentos que podem trazer a nossa mente de volta ao verdadeiro estado original.
Há pessoas cujo modo de vida é abalado por uma provação que repentinamente se abate sobre elas; os sedimentos acumulados são dissipados e elas começam a viver como se tivessem sido despertas para a sanidade.
Outros podem um dia sentirem-se chocados ao descobrirem que estão gravemente enfermos, mas, ao mesmo tempo, sentir que o mundo ao redor assume uma forma completamente diferente do que era antes. Às vezes, o véu que cobre o mundo é arrancado e o ambiente ao redor começa a brilhar com frescor, como se tivesse sido lavado pela chuva.
Viver uma experiência como se o mundo se tornasse um lugar totalmente novo, como se o véu da mente tivesse sido retirado está, na verdade, disponível para todos.
Engajar-se com o mundo
A história de Chula Panthaka registrada nas escrituras budistas é uma jornada da origem dessa renovação da mente.
Quando Pantaka, um dos discípulos de Buda que tinha memória fraca e não conseguia memorizar um único refrão (poema que expressa os ensinamentos do Buda), estava chorando e lamentando por sua própria inadequação, Buda o confortou oferecendo-lhe um pedaço de pano branco e lhe disse o seguinte.
– Ouça bem Panthaka. Use este pano para limpar os calçados dos colegas, entoando com todo fervor em sua mente: “Sujeira vá embora. Impureza vá embora”.
Dizem que desde então, Panthaka limpou diligentemente os calçados todos os dias, focou-se na purificação da sua própria mente e, por fim, alcançou a iluminação.
É nada menos do que uma história de purificação espiritual e iluminação de uma alma inocente, mas, ao mesmo tempo, acredito que é também uma jornada que abre novos caminhos ao engajar-se profundamente com o mundo através de sincera devoção.
Há elementos estranhos que se interpõem entre nós e o mundo e se tornam como um véu. Quando essas impurezas estão presentes, não podemos entrar em contato direto com o mundo. Em um sentido real, somos impedidos de viver no mundo tal como ele é.
No entanto, quando continuamos a enfrentar o mundo com uma única mente com base nas nossas aspirações mais sinceras, rompemos esses limites. Vivenciamos o momento em que removemos nosso próprio véu e impurezas e entramos em contato com o próprio mundo. Isso é nada menos que um momento vívido de iluminação, de conhecer e viver no mundo verdadeiro.
Parece que enxergamos o mundo, mas não o vemos. Parece que estamos em contato com o mundo, mas não estamos. Nós, seres humanos, estamos sempre presos nessa armadilha. Neste mês, gostaria de incentivá-lo a ir além dessa armadilha e a engajar-se com o mundo.